Uma das dúvidas mais comuns nos cursos de educação executiva que ministro no Brasil é sobre que cursos os executivos devem seguir para se manterem atualizados e agregarem conhecimento. Essa dúvida permeia todos os estratos, desde os recém saídos da universidade até executivos seniores. O que poucos entendem é que o que chamamos de MBA no Brasil não é reconhecido assim no mundo.

O Brasil é um país tão fechado que a maioria das pessoas, mesmo com alto nível formal de educação, simplesmente não sabe o significado do que cursou. Pior ainda, aqui muitos pesquisadores, que deveriam ser mais esclarecidos, usam pós-doutorado como titulação, embora, na verdade, seja basicamente uma forma de turismo acadêmico. Nosso atraso intelectual se revela de várias formas, e uma das mais perniciosas é desenvolver uma indústria de educação superior que às vezes não oferece, com clareza, produtos compatíveis com sua descrição, que é mais ou menos padrão no resto do mundo. O caso do MBA (Master em Business Administration) é o mais interessante. O Brasil, ao contrário do resto do mundo, é um celeiro de pós-graduados com “títulos” de MBA em diversas áreas, de Gestão Empresarial (redundância que passa desapercebida) a Gestão de Serviços Radiológicos. Nada disso realmente existe no resto do mundo.

O que é um MBA?

Um MBA, no modelo internacional, é um produto que tem algumas características peculiares: é em tempo integral, para executivos em meio de carreira que buscam um salto profissional, e tem como objetivo não somente o conhecimento, mas também a recolocação do executivo, que normalmente se desliga do emprego original. Bons cursos de MBA tem profissionais de várias nacionalidades, trajetórias profissionais e setores econômicos. Um dos principais objetivos é o networking e é papel da escola de negócios ajudar os profissionais na recolocação profissional. Eu gosto da lista do Financial Times, que mostra os benefícios de cada um dos principais MBAs do mundo. Infelizmente, não existe nenhum MBA brasileiro na lista. Uma das razões é simples: existem muito poucos MBAs de verdade no Brasil! Um dos exemplos de excelente curso, e talvez o melhor do Brasil, é o da COPPEAD, que exige dedicação exclusiva e é gratuito. Na verdade, é um Mestrado Executivo, mas utiliza o modelo internacional e é respeitado no mundo, embora seu processo de internacionalização tenha sido relativamente recente, com aulas em inglês e busca de executivos estrangeiros para fazer parte de suas turmas. O único curso de MBA que a COPPEAD confere aos executivos é o de MBA Executivo, que é outro produto reconhecido mundialmente, mas que difere do MBA full por exigir dedicação parcial e permitir que o executivo trabalhe e faça o curso.

Dou aula, no Brasil, na Fundação Dom Cabral. Por ser uma escola que segue os padrões internacionais não temos um MBA, mas sim um Executive MBA, que exige alto investimento e busca conciliar questões como networking, conhecimento atual e geração de valor, através de um projeto final aplicado. As especializações que muitos brasileiros fazem, inclusive saídos diretamente da faculdade, são exatamente isso, especializações em determinadas áreas de Administração, Finanças e Economia. Poucos brasileiros realmente fizeram um MBA (ou EMBA), mas muitos tem o título. Existem associações mundiais, como Equis, AMBA e EMBAC, que promovem padrões de qualidade mundiais. É claro que a maioria dos “MBAs” brasileiros não tem qualquer acreditação (não que ser acreditado seja sinônimo de qualidade). MBAs em qualquer esquina, mais uma jabuticaba brasileira.

MBAs

 

Pós-doutorado, turismo acadêmico e benefícios indiretos.

Ao ver um cientista brasileiro se gabando do seu pós-doutorado, desconfie. Se a diferença entre o MBA no mundo e no Brasil é resultado da nossa falta de integração (além da regulação light da pós-graduação lato sensu, que garante autonomia universitária pare que as instituições usem os nomes que quiserem para seus cursos), o caso do pós-doutorado não pode ser explicado por isso, pois é resultado de um elitismo por parte de pesquisadores que deveriam ser mais bem informados. O pós-doutorado é usado no mundo para que os recém-doutores que não conseguiram empregos de professores assistentes possam continuar fazendo pesquisa, para conseguirem, no futuro, subir na carreira. Pós-doutorado não é título. Não existe pós-doutor e o PhD (doutorado) é o maior título acadêmico que existe. Por que então no Brasil muitos pesquisadores colocam no Lattes (currículo padrão dos acadêmicos brasileiros) o pós-doutorado quase como título? Por duas razões: no passado, quando o país vivia em crises cambiais constantes, fazer o pós-doutorado no exterior era um benefício indireto de ser professor de universidade pública. Muitos usavam o pós-doutorado como turismo acadêmico (prática comum em todo o mundo, especialmente na escolha de conferências), enquanto outros usavam a oportunidade para criar uma rede de contatos no exterior. De qualquer forma, a não ser que o pós-doutorado fosse para fazer parte de uma equipe de uma sumidade da área, essa experiência não é algo que deveria constar no currículo de forma destacada.

Conheço vários cientistas que estão fazendo pós-doutorado na NYU Shanghai. Todos estão dando o máximo para que suas pesquisas sejam publicadas, de forma a conseguir um emprego permanente em alguma instituição de ponta. No mundo a última qualificação de um cientista é o doutorado, mas no país da jabuticaba inventamos mais uma forma de discriminar pesquisadores, através de um “título” inexistente.

Acho pequena a visão brasileira focada em titulações como forma de diferenciação. Não usamos títulos somente como sinais no mercado de trabalho, mas também como outra forma de “elites” se manterem distantes da realidade de um país desigual. Mas se for para se fazer isso, que pelo menos deixemos de usar títulos inexistentes.