Originalmente publicado no site administradores

Gastamos 500 bilhões de reais e entramos em crise econômica. Isso vai contra o que a maioria dos professores de economia no Brasil ensina. Afinal, investimento, mesmo mal feito, deveria gerar renda que, por sua vez, levaria a investimentos privados, em um círculo virtuoso que representa o sonho do desenvolvimentismo que acometeu os formuladores de políticas públicas brasileiros no início dessa década. Brasil número 1, com assento no conselho de segurança da ONU, parte da OPEP, e levantando vôo na capa da revista The Economist.

Para explicar como os sonhos de grandeza viraram o pesadelo que estamos vivendo, precisamos de um conceito ensinado em qualquer curso de economia fora do Brasil, mas que é rejeitado quase que por hipótese em muitas escolas do Brasil: crowding out. Esse efeito acontece quando investimentos públicos deslocam investimentos privados, substituindo-os parcial ou totalmente. Assim, se os investimentos públicos forem improdutivos, o resultado, mesmo que paradoxal à primeira vista, é: o aumento de investimentos leva a perda de bem estar social.

No efeito oposto, o crowding in, investimentos públicos produtivos criam oportunidades para investidores privados e a consequência é a de um multiplicador de investimentos que levaria a um círculo virtuoso. É baseado nessa ideia que o novo desenvolvimentismo do governo Dilma alocou centenas de bilhões de reais ao BNDES, estimulou milhares de projetos no Brasil com dinheiro público e a Petrobras criou o maior projeto de investimentos da história do setor petrolífero mundial. No auge do ufanismo e hubris do governo brasileiro, resolvemos até bancar a construção de um submarino nuclear, cujo objetivo era proteger o maravilhoso pré-sal brasileiro dos malvados imperialistas internacionais.

Foi tudo por água abaixo, quase que literalmente. Toda essa dinheirama custeou ineficiência e corrupção em uma escala nunca antes vista nesse país. E, pra piorar, gerou crowding out que nos ajudou a afundarmos na nossa crise. Mas como crowding out surge?

Sabemos que países emergentes têm pouca poupança agregada. Quando o governo resolve criar projetos megalomaníacos, pega dinheiro emprestado através da emissão de títulos. Isso diminui a quantidade de recursos para investimentos privados. De forma mais simples, a taxa de juros aumenta e o investimento privado diminui. Todos sabemos que investir no Brasil é caro. Uma das razões é porque o governo compete com as empresas pela pouca poupança criada no Brasil. Quando utiliza mal esses recursos, o resultado é o que vamos ainda hoje no Brasil: crise econômica com déficit e dívida pública crescentes.

Crowding in em princípio é possível. Um exemplo: imaginemos um país pobre com potencial exportador, mas sem portos. O governo toma dinheiro emprestado da sociedade para construir um porto, melhorando o acesso do país ao resto do mundo. Agentes privados investem em novos setores exportadores, agora que há capacidade de escoamento da produção. Investimentos públicos geram investimentos privados. O multiplicador Keynesiano, que gera o círculo virtuoso ensinado na maioria da Universidades brasileiras, entra em ação e todos ganham.

Economia não é uma ciência natural. Não há leis universais. Prescrições de políticas dependem de contexto. Sob diferentes contextos, um gasto governamental pode gerar crowding out ou crowding in. O nosso erro está em achar que as oportunidades de crowding in são muitas. Não são. Normalmente estão em países bem pobres e que não passaram por processos de industrialização ou desenvolvimento. O Brasil já é um país industrial com sistema financeiro razoavelmente desenvolvido. Achar que o governo vai saber escolher onde investir de forma a alocar recursos da sociedade de forma eficiente é ser muito ingênuo. Vimos o que aconteceu no governo Dilma. Jogamos meio trilhão de reais pelo ralo (e nos bolsos de muitos corruptos).

Está na hora de virarmos adultos e tratarmos os recursos públicos com seriedade. Eles são escassos. O governo tem papel importante na alocação de recursos e investimentos da sociedade. Mas isso deve ser feito de forma muito criteriosa, de forma a não gerar crowding out. Parcerias público-privadas, se muito bem desenhadas, podem gerar investimentos complementares entre o setor público e privado. Pior que ter errado no passado é continuar insistindo no erro. Políticas econômicas dependem de contexto. Somos um país de classe média baixa preso na “armadilha da classe média”, um termo usado para países que saem da pobreza e param de se desenvolver.

Estamos na vanguarda do atraso, junto com Argentina, Turquia, Rússia, e outros países com instituições medíocres e governos messiânicos. O caminho para sair da crise não é injetar dinheiro público, caro e escasso, e sim permitir e incentivar investimentos privados. Isso parece conselho de economista neoliberal. Não é. O governo pode nos tirar dessa situação. Criando regras claras, mostrando competência na gestão da coisa pública, e gerando credibilidade para que empresas locais e internacionais invistam no país. Mas sem submarinos nucleares.